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CEOs dos GAFA em audição pela comissão de inquérito do congresso norte-americano


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A última semana de julho foi uma semana marcante para os GAFA (Google, Apple, Facebook e Amazon) que, pela primeira vez, foram convocados em conjunto para depor no congresso norte-americano, onde estiveram mais de 5 horas e meia.

Em causa está a dimensão e o poder de mercado que estas quatro empresas têm, o abuso de posição dominante e também a ética nos negócios. Os congressistas democratas e republicanos colocaram mais de 200 questões aos CEOs das quatro empresas.

Ao contrário de inquéritos anteriores, desta vez os congressistas estavam bem preparados e nota-se uma grande evolução sobre o entendimento das plataformas digitais, a importância dos dados e os novos modelos económicos e de gestão que estas empresas criaram.

Apenas uma gafe com um congressista a questionar Mark Zuckerberg, fundador e CEO do Facebook, sobre um post do filho do presidente norte-americano que foi apagado no Twitter, ao que Zuckerberg respondeu “isso não foi na minha rede social” 🙂

A maior expectativa estava em Jeff Bezos, fundador e CEO da Amazon, que pela primeira vez foi interrogado no congresso norte americano.

No depoimento inicial de 5 minutos que todos fizeram, destacaram as suas experiências de vida e de como concretizaram o sonho americano, criando e gerindo empresas que hoje são motivo de orgulho.

Ao longo de quase 6 horas, os congressistas tentaram apresentar argumentos e provar que estas empresas não só criaram monopólios, como também abusaram das suas posições dominantes e questionaram de forma muito acutilante a ética nos negócios e as posições políticas. As quatro empresas foram confrontadas com várias situações nas relações com parceiros e inclusive os congressistas partilharam as suas experiências pessoais, questionando em particular a Google e o Facebook sobre a forma como os dados e a informação são geridos.

Os argumentos do congresso para desagregar estas empresas são evitar situações de abuso de posição dominante, assim como promover a inovação, o empreendedorismo e a competitividade, que são variáveis fundamentais num modelo capitalista como é a economia americana.

Partir ou desagregar unidades de negócio de uma empresa não é uma nova realidade nos Estados Unidos, já aconteceu no passado em várias empresas e indústrias. Um dos casos mais marcantes foi o da Standard Oil, que era a maior empresa petrolífera do mundo e foi dividida em 34 empresas em 1911. Outro caso é o da operadora de telecomunicações AT&T que, em 1982, foi divida em várias operadoras regionais que ficaram conhecidas como Baby Bells. Ainda hoje, este é um caso de estudo na disciplina de Regulação e Concorrência nos cursos de economia em todo o mundo.

Mais recentemente na indústria de tecnologia informática, destaca-se o caso da Microsoft que, em 2001, foi acusada pelo governo norte-americano de abuso de posição dominante no browser Internet Explorer, que integrava o sistema operativo Windows. Neste caso, a Microsoft, como sabemos, não chegou a ser dividida, mas teve de fazer concessões e chegar a acordo com o governo norte-americano.

O interrogatório foi como referi longo e muito interessante, mas deixo-lhe os principais destaques:

Amazon – Jeff Bezos

As questões a Jeff Bezos foram sobretudo sobre a forma como são tratadas as empresas que vendem através do marketplace da Amazon e como são utilizados os dados para desenvolver produtos concorrentes e uma política de preços que podem indiciar a prática de dumping, para esmagar as margens destes parceiros.

Bezos diz que esta não é a política da Amazon, mas que não podia garantir que esta não tenha sido alguma vez violada.

Foi também questionado sobre o investimento do fundo Alexa Fund na empresa Portuguesa DefinedCrowd. Bezos disse que não tinha conhecimento sobre o investimento.

E sobre o artigo do Wall Street Journal, que relata o facto de que, quatro anos depois deste investimento, desenvolveu na AWS (Amazon Web Services) uma ferramenta que faz quase o mesmo que a DefinedCrowd, Bezos diz que leu o artigo, mas que não se recordava especificamente deste caso e que está disponível para recolher informação sobre o assunto para partilhar com o congresso.

Google / Alphabet – Sundar Pichai

O CEO da Google, Sundar Pichai, foi muito questionado sobre a utilização de dados nas suas plataformas, sobre a aquisição da DoubleClick em 2007 e sobre a forma os dados da publicidade são utilizados pela Google.

Outro tema quente foi o apoio político, em particular ao partido democrata, tendo sido questionado se a empresa está a alterar os algoritmos das suas plataformas para favorecer o candidato democrata Joe Biden, ao que Sundar Pichai respondeu que não.

Ainda na política e na relação com o governo norte-americano, foi questionado sobre o projeto Maven, um projeto de inteligência artificial que a Google estava a desenvolver para o departamento de Defesa dos EUA e que abandonou, depois de alguns colaboradores da Google terem questionado a ética deste projeto, e por outro lado estar a desenvolver projetos com universidades e organizações chinesas.

Facebook – Mark Zuckerberg

Mark Zuckerberg foi confrontado com muitas comunicações internas, onde eram claras as orientações para desenvolver funcionalidades que já estavam disponíveis em plataformas concorrentes.

Foi também muito questionado sobre a forma como negociou a compra do Instagram em 2012.

Apple – Tim Cook

As questões ao CEO da Apple foram sobretudo em relação à App Store, incluindo o valor de comissão cobrado nas aplicações pagas e nas subscrições, e sobre o desenvolvimento de funcionalidades no sistema operativo (como por exemplo, o controlo parental) que concorre com aplicações que estão na sua App Store.

Outro tema foi a forma como negociou com os editores a entrada na iBooks (loja de livros digitais da Apple), em particular o caso com a Random House.

Em resumo:

Os congressistas tentaram provar a dominância de mercado e alguns abusos, e as quatro empresas todas tentaram demonstrar que não são gigantes e que têm regras que garantem a transparência e fair play na relação com utilizadores e parceiros.

Não é fácil partir estas empresas, dado que há uma integração cruzada de negócios e a criação de ecossistemas. E isto não se verificava nos casos da Standard Oil e da AT&T, que referi anteriormente.

Por outro lado, o mercado onde estas empresas atuam é mundial e onde enfrentam empresas com dimensões semelhantes, como é o caso das empresas tecnológicas chinesas. Isto será também um ponderador importante para o governo americano.

É difícil perceber quais as cenas dos próximos capítulos, mas este inquérito foi um momento histórico de viragem que certamente levará estas quatro empresas a ter mais cautela na sua atuação e mesmo nas comunicações internas e externas, pois mais do que nunca passaram a estar debaixo dos holofotes dos políticos e também da sociedade.

Apesar da contração económica que todo o mundo está viver, provocada pela Covid-19, estas empresas continuam a crescer, pois as infraestruturas e plataformas digitais que criaram são cada vez mais essenciais para garantir as trocas comerciais e a comunicação entre pessoas e empresas. Prova disso, são os últimos resultados trimestrais apresentados logo no dia após testemunharem no congresso.

Vídeo integral:

 

 

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