
Dominique Piotet (HIT): “O ecossistema tecnológico ucraniano é incrível”
Dominique Piotet é CEO e cofundador da HIT – Humanitarian Innovative Technologies. Esta ONG ucraniana tem como missão apoiar causas humanitárias através de soluções tecnológicas inovadoras.
Nesta entrevista na Web Summit, Dominique Piotet revela como a impressão 3D está a ser utilizada para construir uma escola na cidade de Lviv, na Ucrânia, e dá-nos uma visão sobre o ecossistema de inovação ucraniano.
Como nasceu a HIT – Humanitarian Innovative Technologies?
O objetivo da HIT é perceber como podemos utilizar a tecnologia para construir coisas boas, especialmente para a Ucrânia, porque partimos da Ucrânia e decidimos começar com a reconstrução de edifícios, utilizando tecnologia de impressão 3D.
Neste momento, estamos a utilizar a impressão 3D para a construção de uma escola em Lviv, na fronteira ocidental da Ucrânia, porque muitas pessoas estão a ser deslocadas e queremos construir edifícios que irão perdurar. A tecnologia de impressão 3D é óptima porque podemos usar cimento. Estamos a construir muros verdadeiros, casas verdadeiras e vamos construir por toda a Ucrânia.

Quais são as principais vantagens da tecnologia de impressão 3D?
Há bastantes. A primeira é que é rápida. Pode-se imprimir uma casa de 100 metros quadrados entre 24 a 72 horas. Portanto, pode-se fazê-lo bastante rápido, incluindo a impressão, as fundações e o telhado. Outra vantagem é que, se for bem feita a construção, utilizamos menos materiais. Por isso, é ecológico e sustentável.
A terceira vantagem é que não são necessárias tantas pessoas. Para construir uma casa só são necessárias duas pessoas para operar a impressora. Resumindo: é mais rápido, mais ecológico e requer menos materiais e menos pessoas. Por isso, é muito útil.
O sucesso desta iniciativa pode levar à construção de outro tipo de edifícios, como casas ou infraestruturas?
Sim. A tecnologia atual que utilizamos é de uma empresa da Dinamarca, a Cobod, que é líder de mercado. São capazes de construir edifícios com até três andares e não há restrições porque podemos deslocar a impressora para qualquer lugar e construir o que quisermos. Estamos também a avaliar a utilização de tecnologia de impressão em 3D para construir pontes, que, como sabemos, foram destruídas durante a guerra.
Como prevê o crescimento da indústria da tecnologia de impressão 3D a nível mundial nos próximos anos?
Penso que para a construção, estamos no início de uma revolução porque precisamos de melhor tecnologia para construir. Quando olho para os EUA, onde vivo, temos vindo a construir casas da mesma forma há séculos, não estamos a utilizar tecnologia verdadeiramente nova para construir novos edifícios. Precisamos de construir edifícios que sejam mais eficientes em termos energéticos, porque hoje, os nossos edifícios são verdadeiramente pobres na forma como estão a utilizar a energia. Precisamos de construir de forma mais robusta, mais rápida e precisamos de trazer tecnologias inteligentes para dentro dos edifícios. E isto é apenas o começo.
Para além da construção, que outro tipo de contribuição está a ser dada pela HIT para responder às necessidades das pessoas na Ucrânia?
Na realidade, começámos por ajudar os refugiados, e essa foi a nossa primeira ação. O nosso segundo programa consiste em levar alimentos para que sejam entregues na linha da frente. Neste momento, estamos a entregar mais de 5.000 toneladas de alimentos por mês. Alimentamos quase 300.000 pessoas todos os dias. Temos um armazém e 60 pessoas no terreno apenas a fazer isso. Vemos isto como algo necessário, mas isto não é tecnologia. Queremos ter um impacto a mais longo prazo e é por isso que estamos a trazer a tecnologia para o que estamos a fazer. Mas muitas coisas precisam de ser feitas e é apenas o começo de uma história.
Como é que descreve o ecossistema tecnológico na Ucrânia?
Penso que é algo que as pessoas estão a começar a descobrir, sabiam que os ucranianos eram bons em tecnologia, mas não sabiam é que eram tão bons. Basicamente, o que vemos hoje é um crescimento do ecossistema ucraniano, que está verdadeiramente a mostrar que tem startups extremamente resilientes. 85% das startups que existiam antes da guerra ainda existem. A taxa de “morte” normal de qualquer ecossistema de startups é entre 15% a 20%, mas na Ucrânia o ecossistema está a crescer 20% todos os anos. Mesmo com a guerra, ainda está a crescer.
Assistimos à contribuição do ecossistema tecnológico, inclusive na guerra. Por exemplo, os ucranianos estão a usar tecnologia 3D para modificar drones para ir para o campo e atacar os russos com estes drones, altamente modificados apenas usando tecnologia de impressão 3D. É um ecossistema incrível e penso que vai ter um papel fundamental na reconstrução da Ucrânia.
Termino com uma pergunta pessoal, o que é que o motivou a juntar-se à ajuda humanitária?
Estou a viver na Ucrânia há quase quatro anos. Estava a construir o ecossistema tecnológico da Ucrânia e tinha de ajudar, tinha de apoiar os meus amigos. É quase como o meu terceiro país. Sou francês e americano, e agora sinto-me como se fosse ucraniano.