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Andra Keay: “Robótica está a transitar para um modelo robotics-as-a-service”

A robótica está a tornar-se um serviço e está mais colaborativa, tendo influência em várias indústrias. Andra Keay, diretora do cluster Silicon Valley Robotics, dá conta dos últimos desenvolvimentos e do cenário “exagerado” sobre a questão dos robôs substituirem empregos. 

Quais são as principais tendências na área da robótica? 

Neste momento, o modelo de negócio da robótica está a transitar para um modelo robots-as-a-service. Ou seja, o foco não está no capital investido ou em ser, simplesmente, uma empresa de hardware e nada mais. Mais do que um robô, os clientes pagam pelo valor da solução fornecida e este tem sido um negócio de sucesso para muitas empresas de robótica.

Esta indústria de robótica de serviço está a emergir, com maior ênfase ao nível empresarial e menor ao nível do consumidor. Podemos vê-lo no inventário de robôs em lojas, em grandes armazéns, kiosk robots, em robôs pasteleiros, robôs que fazem pizzas, que fazem colheitas agrícolas ou que empacotam encomendas. A cadeia de distribuição está numa grande revolução, de um modo em geral e, certamente, veremos mais robótica do lado da produção.

Os robôs estão a começar a ter um comportamento mais colaborativo?

Sim. Começamos a ter robôs suficientemente sofisticados que são capazes de fazer um trabalho colaborativo e que permitem o desempenho de pequenos trabalhos básicos, monótonos e perigosos.
Podemos começar a questionar: “Se trabalho numa loja e posso ter um robô, o que vou fazer com ele?”. Se qualquer pessoa tiver acesso a um “braço” robótico, o que fará com ele? Como é que fará o seu trabalho ou tornará a sua vida melhor?. Ainda não temos resposta para muitas destas perguntas.

Que desenvolvimentos estão a impulsionar o trabalho colaborativo dos robôs?

Algumas tecnologias de componentes de robôs estão a tornar-se soft, o que está de mãos dadas com a robótica colaborativa. Algumas empresas de software estão a construir estruturas especialistas no manuseamento de alimentos ou objetos frágeis, que necessitam de uma manipulação higiénica e de um toque suave e delicado.

O filme “Big Hero 6” [da Disney], por exemplo, inspirou-se em investigações científicas em soft robotics. O robô Baymax foi “criado” com base nos desenvolvimentos nesta área e no facto de que é possível construir estruturas robóticas extremamente leves, versáteis e seguras, utilizando inflatable robots.

baymax
Robô Baymax do filme da Disney “Big Hero 6”

 

Quais são as primeiras indústrias a ser impactadas pela robótica? 

A produção já foi impactada, bem como algumas áreas da saúde. A próxima será a da logística e transportes.

Gostaria que a agricultura fosse a seguinte, porque precisamos de duplicar a produção de alimentos para a próxima geração. À medida que a população mundial cresce, a procura por alimentos de elevada qualidade está a aumentar exponencialmente e não temos terreno disponível para cultivar. Precisamos de ser muito mais eficientes na agricultura, através de hortas verticais e de robôs mais pequenos que substituam as máquinas pesadas e de grande dimensão que compactam o solo e com falhas no aproveitamento integral do espaço de cultivo disponível.
Para além da automação e da robótica, também os sensores e a inteligência artificial podem melhorar a agricultura, à medida que é possível segmentar de forma minuciosa e precisa determinadas plantas. É possível aplicar inseticida ou fertilizante somente onde são necessários, o que permite reduzir a quantidade de químicos em pelo menos 10 vezes. Esta representa uma diferença enorme nos custos de cultivo e uma redução exponencial de químicos na cadeia alimentar.

Um dos temas do momento em relação à robótica é a possibilidade de os robôs virem a substituir empregos. Este é um problema real ou propaganda exagerada?

Eu penso que há muitos exageros e é completamente errado. Muitos desses empregos já foram impactados, em grande medida, pela automação trazida pelos computadores e, ainda assim, as taxas de empregos têm-se mantido inalteradas nos últimos 110-120 anos, apesar de termos passado por várias revoluções tecnológicas. O que aconteceu foi que a qualidade dos empregos melhorou e há menos fatalidades, por exemplo.

Os robôs vão substituir tarefas, não empregos, porque um emprego envolve muitas competências e os humanos são bastante sofisticados na sua capacidade de fazer várias coisas de forma natural. Para onde quer que olhe, vejo a possibilidade de integrar robótica e isto vai aumentar o número de empregos, porque não temos pessoas suficientes para construir e programar estes robôs.

Em todas as áreas em que introduzirmos um robô haverá um spin-off de empregos que serão criados. No mundo real, existe uma ligação estreita entre a utilização de robôs e o crescimento da produtividade e competitividade no mercado. É muito mais provável alguém perder o seu emprego porque a empresa onde trabalha não “abraçou” a oportunidade de evoluir através das tecnologias.

Como é que esta transição vai ocorrer? 

Tudo está a mudar com rapidez, mas desenvolver uma estrutura de hardware leva o seu tempo. Não acredito na omnipresença dos robôs do dia para a noite, penso que o ritmo da mudança tecnológica será lento o suficiente para nos permitir uma adaptação.

Como é que vão ser as nossas vidas em 2030?

Vão ser mais leves, um pouco mais automatizadas num bom sentido – se as coisas correrem bem e forem acessíveis. A automação vai fazer o trabalho pesado e oferecer-nos um número de possibilidades sem precedentes para controlar aquilo que fazemos e como fazemos. Mas, ao mesmo tempo, na minha opinião, o inconveniente é que isto pode estar acessível só para alguns.

A questão não se centrará tanto nos robôs. Sinto verdadeiramente que a gig economy é espectacular para freelancers com poder económico, mas pouco vantajosa para quem não tem segurança ao nível dos cuidados de saúde e rendimentos e anda a ‘saltar’ de emprego em emprego.

As nossas vidas vão tender para as micro-transações e isto pode ser muito eficiente, mas, ao mesmo tempo, menos humano. O problema não serão tanto os robôs, mas sim o facto de estarmos bastante felizes a tratar grande parte da nossa população como robôs – como uma espécie de engrenagens substituíveis numa espécie de mundo em “roda” ligeiramente mecânico.

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