
Wish, a “desconhecida” empresa de 10mM de dólares
Artigo de Joachim Renaudin, Lead Analyst na FABERNOVEL
Nunca ouviu falar da Wish? Deveria. Em apenas 7 anos, esta startup tornou-se uma rival da Amazon num segmento de mercado negligenciado por todos: as classes trabalhadoras. Sobrepondo o preço à qualidade, a Wish tem uma valorização perto de 10 mil milhões de dólares. Aqui fica uma visão sobre esta gigante, muito pouco conhecida, que deixou a Amazon preocupada.
Wish, ainda não lhe diz nada? Mesmo assim, provavelmente, já se deve ter cruzado com anúncios nos media sociais sobre um dos seus produtos com reduções de preço extravagantes: em 2017, a aplicação era o segundo maior anunciante do Facebook. Sem ninguém se aperceber, a Wish entrou nas nossas vidas diariamente – e nas vidas de milhões de americanos e europeus que a utilizam para comprar tudo e nada (literalmente).
A Wish é uma aplicação móvel que permite descobrir e comprar produtos (como gadgets, roupas, artigos de decoração e eletrónica) a preços muito reduzidos. Há um ano, a Wish tornou-se a app de compras líder na Android Store e iOS. Com mais de 2 milhões de encomendas enviadas todos os dias e perto de 300 milhões de clientes, a empresa, criada em 2011, tem uma valorização de 8,5 mil milhões de dólares.
Como é que uma startup de e-commerce conseguiu crescer tão rápido ao ponto de assustar empresas como a Amazon e o eBay e tornar-se a principal marca nas compras mobile low-cost? E, mais estranho ainda, sem ninguém se aperceber?
A Wish e a Amazon utilizaram a mesma estratégia: o modelo em plataforma
Nos EUA, a Amazon é a líder indiscutível no e-commerce, com 44% de todas as vendas, e absorve quase todo o crescimento no setor. Todo? Não, a Wish também tem apresentado um crescimento exponencial, parcialmente graças a um modelo de marketplace muito semelhante ao da Amazon.
Na nova economia, o comércio em plataforma é um modelo vencedor. Estas empresas conseguem crescer muito mais rápido do que os concorrentes porque são bem sucedidas na captação de grande parte do valor gerado por outros players nas suas plataformas.

Tal como a Amazon, a plataforma da Wish assenta num modelo marketplace. A sua app liga vendedores e pequenos distribuidores na China (quase 500 mil) a consumidores americanos e europeus motivados pelo fator preço.
Contudo, não compra, armazena ou entrega os produtos. A Wish tem muitas vantagens competitivas quando comparada com um retalhista tradicional:
- Inventário quase infinito: 70 milhões de produtos disponíveis através da app.
- Custos marginais reduzidos: um modelo de negócio baseado num sistema de comissão nas transações.
- Um mercado global: a facilidade de entrada em novos mercados permitiu à plataforma entrar em cerca de 100 países.
Com uma app descarregada milhões de vezes, a Wish consegue atrair fornecedores chineses porque chega a vários mercados europeus e americanos. O resultado? Os efeitos de rede começam a funcionar: cada fornecedor extra atrai novos clientes, que, por seu lado, atraem mais fornecedores e por aí adiante.

Mas o verdadeiro motivo para o espantoso sucesso da Wish num mercado muito competitivo é o facto de oferecer uma experiência do utilizador verdadeiramente diferente do modelo Amazon.
Com um modelo marketplace semelhante ao da Amazon, mas uma experiência do utilizador muito diferente, a Wish conseguiu atingir um novo alvo.
Um modelo de experiência completamente novo: comércio de navegação
O marketplace da Amazon é a solução ideal se estivermos à procura de um produto específico: possui uma barra de pesquisa central no site, um catálogo de produtos muito bem organizado, algoritmos de recomendação que nos lembram de (re)comprar produtos, etc.
Tal como o Google quer que passemos o mínimo de tempo possível a navegar no motor de busca, a Amazon tenta mostrar-nos o produto certo o mais rápido possível.
A Wish concentra-se numa necessidade completamente diferente: a vontade de descobrir produtos quando não se tem nada em particular em mente, quando se precisa de inspiração, quando se quer fazer uma compra por impulso de gadgets ou de um presente. Tal como quando andamos por uma loja, podemos andar pela Wish e deixar que os produtos (ou promoções) nos surpreendam.
A Wish chama a isto comércio de navegação. Tal como quando fazemos scroll na feed do Facebook ou quando procuramos inspiração no Pinterest, podemos pesquisar produtos que nos foram recomendados e com melhores preços do que a concorrência!
Preço > Experiência
Para além da interface de navegação, é, sobretudo, a proposta de valor da Wish aquilo que a diferencia da Amazon.
A Amazon tem uma ordem de prioridades muito clara (como foi referido pelo CEO da Wish):
- A experiência do utilizador: os clientes devem receber as encomendas o mais rápido possível (Amazon Prime, Prime Now), com embalagens de qualidade e um experiência de confiança.
- A qualidade do produto: existe uma grande variedade de produtos, para oferecer sempre o produto certo ao cliente certo.
- O preço: oferece quase sistematicamente um preço 10% abaixo do melhor preço do mercado.
Foi assim que a Amazon conseguiu seduzir uma grande parte da população americana, venceu através de uma experiência de compra excecional. Mas, ainda continua a tentar chegar às classes trabalhadoras, para as quais o preço é o principal motivador. E é exatamente este o alvo da Wish!
Com uma postura oposta à da Amazon, a Wish concentra-se nos compradores com menor poder económico (abaixo do rendimento mediano) que preferem o preço às marcas e que agora têm smartphones. O tipo de compradores que pensam para si: “Se for demasiado caro não tenho capacidade para comprar, por isso não me importo que só esteja disponível para entrega no dia seguinte“.
A Wish, simplesmente, inverteu a pirâmide da Amazon:
1) Preço: promove uma redução de preços todos os meses. Os vendedores são encorajados a oferecer promoções.
2) Qualidade: os produtos são maioritariamente da China e de qualidade média ou fraca.
3) Experiência do utilizador (logística e fiabilidade): o tempo de entrega é normalmente entre duas a três semanas e algumas encomendas acabam por nunca chegar.
Esta experiência diferenciadora é exatamente a chave do sucesso da Wish. A empresa concentrou-se num segmento de mercado negligenciado, focou-se nas principais prioridades deste mercado e carregou nos botões certos: preço, inspiração, gamificação e surpresa. Ao mesmo tempo, evitou os padrões da experiência de e-commerce concebida para os consumidores com maior poder de compra.
Isto também explica o porquê de a Wish ter passado completamente despercebida do radar da imprensa e ter tido dificuldades em captar financiamento.
Conclusão
Apesar de a Wish se ter inspirado no modelo Amazon, agora é a Amazon que se está a inspirar no modelo Wish. Depois de ter tentado, sem sucesso, adquirir a Wish por 10 mil milhões de dólares, a Amazon anunciou o lançamento da categoria $10 & under.
Mas o crescimento exponencial da plataforma levanta questões que vão para além de uma mera análise económica. Apesar de a Wish ser, sem dúvida, um negócio de sucesso, o que dizer do impacto ambiental da sua plataforma? Das condições em que os objetos são produzidos? Ou da forma descarada como a gamificação é utilizada para impulsionar compras “desnecessárias”?
A revolução digital oferece às empresas ferramentas extraordinárias para desenvolver e conectar-se com o mundo e a Wish é um exemplo destas novas oportunidades. Mas visto que os gigantes digitais parecem evitar aceitar as responsabilidade que resultam destes poderes extraordinários, cabe aos consumidores escolher que plataforma querem utilizar para fazer compras, receber informação, comunicar…
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