
Shai Wininger: “Não vejo as seguradoras tradicionais como concorrentes em inovação”
Shai Wininger, co-fundador da startup insurtech Lemonade, acredita que a criação de uma loveable brand é o caminho para estar um passo à frente da concorrência. Numa entrevista exclusiva ao SuperToast, durante o Web Summit, revelou que não considera as grandes seguradoras como concorrentes no domínio da inovação.
Quais são as principais diferenças entre a Lemonade e uma seguradora tradicional?
A Lemonade explora a Inteligência Artificial (IA), a economia comportamental e é guiada pelo bem social. Ao contrário das seguradoras tradicionais, utilizamos bots, em vez de intermediários e algoritmos, em vez de papelada.
Mas, a grande diferença está no nosso modelo de negócio. A empresa foi fundada com base na ideia de que o estado atual da indústria de seguros era frustrante, ultrapassada e desencadeava reações negativas nas pessoas. Porque é que as pessoas odeiam seguros? Porque estão sempre a pagar e quando surge algum problema e necessitam de acioná-lo os problemas começam. A seguradora não quer pagar, porque o seu modelo de negócio assenta no conflito de interesse. Cada dólar que a seguradora paga ao cliente é menos um dólar em lucro.
Desde cedo percebemos que pretendíamos criar uma nova loveable brand e na qual os clientes confiassem. Conquistar a confiança foi um fator-chave, mesmo antes de avançarmos para a o desenvolvimento da experiência do utilizador, de uma marca cool, de uma boa comunicação e outros fatores.
Reinventámos o modelo de negócio ao cobrar uma pequena percentagem fixa do valor de cada apólice e aplicando o restante na gestão de ativação de seguros (incluindo resseguros e outras despesas). Se sobrarem fundos, doamos a iniciativas de caridade escolhidas pelo cliente. Portanto, ao contrário das seguradoras tradicionais, os lucros vão para organizações sem fins lucrativos.
Desta forma, eliminamos o conflito, uma vez que ficamos com a nossa fatia e não temos interesse em negar a ativação de seguros. Se um pedido de ativação for feito, o nosso objetivo é fazer o reembolso o mais rápido possível porque queremos que o cliente esteja feliz e que esqueça a situação por que passou. Através deste modelo de negócio e utilizando IA, estamos em posição para sermos os mais rápidos do planeta a reembolsar os clientes. Cerca de 30% dos reembolsos são realizados em 3 segundos: basta abrir a app, dizer-nos o que se passou, responder a algumas questões do nosso bot e, se for aprovado, fazemos o reembolso para a conta bancária. Tão simples quanto isto.
Como é que se posicionam à frente da concorrência?
Primeiro, penso que criámos a nossa própria tecnologia. É algo que fizemos desde o primeiro dia. Somos uma seguradora ‘completa’ – não somos um intermediário ou um agente. Determinamos o risco para potenciais clientes, trabalhamos diretamente com reguladores, acarretamos o risco e vendemos o seguro.
A nossa tecnologia backend gere tudo. Desde o chatbot que subscreve o seguro, à gestão de ativações de seguros e gestão de apólices. Tudo isto foi desenvolvido internamente, o que nos permite mover muito rápido e inovar mais do que qualquer outra empresa neste setor.
Para dar um exemplo: a nossa equipa faz alterações ao nível da produção nas nossas apps 5 vezes por dia. Uma seguradora tradicional está muito longe de fazer iterações a esta velocidade. Penso que a velocidade, transparência, uma verdadeira loveable brand, criando em contínuo uma oferta alinhada com os clientes, conceber ótimas experiências, investir no design e naquilo que as pessoas sentem quando usam o produto são todos eles factores diferenciadores em relação aos players tradicionais.
Recentemente, lançaram o Zero Everything, um seguro que elimina franquias. Podemos esperar mais produtos inovadores?
Sim. Durante o primeiro ano, inovamos bastante ao nível da tecnologia, com a Live Policy, por exemplo, que permite às pessoas actualizar ou fazer alterações nos seguros de forma autónoma, em alguns cliques e sem necessitar de um intermediário. Isto é válido para alterar a cobertura do seguro ou acrescentar um seguro para o anel de casamento, uma bicicleta.
O segundo nível de inovação que vamos ver crescer na Lemonade é um tipo mais profundo de inovação nos produtos de seguros onde introduzimos novos tipos de produtos no mercado, criamos novas funcionalidades “em cima” dos produtos existentes no mercado. Vêm aí muitas novidades, brevemente.
Que tipo de seguro é mais procurado?
Eu diria que é os seguros para arrendatários são, logicamente e naturalmente, os que vendemos mais devido ao baixo custo. É possível chegar mais facilmente a uma vasta audiência que necessita de seguros para arrendatários do que com os proprietários, por exemplo. A maioria dos nossos clientes estão a subscrever um seguro pela primeira vez, o que significa que fazem a primeira apólice com a Lemonade. E este é todo um novo mercado que estamos a descobrir. Claro que as apólice para proprietários de imóveis são exponencialmente mais caras, mas depende se estamos a olhar para receitas ou números de apólices. Da perspectiva dos números, os seguros para arrendatários são o nosso produto mais popular.
Pode partilhar alguns dos resultados da Lemonade?
Estamos prestes a lançar a nossa próxima “Crónica de Transparência”, na qual divulgamos o que estamos a fazer, números e estatísticas. Posso adiantar que superámos 5 vezes o plano original que traçamos para este ano. E este mês vendemos mais apólices do que tenhamos estimado vender durante todo o ano.
Neste momento, estamos só focados no mercado dos Estados Unidos. Começámos em Nova Iorque, depois estendemos para Illinois, California, Texas, Nova Jérsia, Nevada e Rhode Island. Estamos a crescer exponencialmente, tem sido fantástico.
Qual o futuro da indústria dos seguros nos próximos anos?
Penso que vamos ter um ou dois líderes de mercado que vão emergir da insurtech para a indústria geral. Acredito que vamos ver aparecer muitos mais produtos, desenvolvidos pelo empresas insurtech, que não existiam anteriormente no mercado. Isto porque a tecnologia abre novas oportunidades, tais como manter uma conversa diretamente com o cliente.
Penso que haverá uma maior integração de inteligência artificial e machine learning na experiência do utilizador, não só no back-end, para fazer investigação e na compreensão relativa a preços, mas também num verdadeiro serviço aos clientes e na melhoria da eficiência das seguradores. Acreditamos que somos líderes nesta área e vamos ver esta tendência multiplicar-se brevemente.
Antevejo que a IA, novos produtos e um par de empresas vão dominar o mercado de seguradoras tecnológicas.
E as gigantes “tradicionais”?
Não as vejo como competição direta em inovação, mas vejo-as como competição direta, uma vez que podem, eventualmente, abordar os mesmo clientes. Penso que seguradoras tradicionais não serão capazes de inovar, mover-se com rapidez e reinventar-se enquanto marca. Estão numa espécie de beco, dado que dependem de agentes e intermediários para vender o produto. Se começarem a investir em algo que as tire de cena, vão perder o negócio que têm hoje e não acredito que uma grande seguradora vá arriscar o stock da sua empresa para apostar em algo que ainda não está comprovado a uma escala mundial.
Não as considero, por isso, um player do lado da inovação. Vamos vê-las maioritariamente do lado do investimento e da aquisição, e penso que haverá uma grande consolidação dos próximos anos.
Porque é que estão nessa posição, na sua perspetiva?
A questão aqui não está ligada à tecnologia, ou em copiar produtos. Trata-se de inovar, criar a marca, contar a história certa, atrair uma audiência que segmentamos muito bem. As seguradoras que possuem uma dimensão elevada dirigem-se a uma audiência muito vasta. Enquanto nós, porque somos pequenos, temos a capacidade de nos focarmos em millennials ou Geração Z e de nos tornarmos especialistas na comunicação, design e experiência de utilizador para essa audiência. Não acredito que alguma das grandes seguradoras consiga conquistar esse mercado. Na minha opinião, não estão em posição para tal.