A digitalização e a comunicação em rede (IP – Internet Protocol) estão na origem das profundas alterações que hoje assistimos na nossa sociedade. Todas as indústrias viram os seus modelos de negócios e de operações alterados, mas a indústria que maior impacto sentiu, foi a indústria de Media & Entretenimento e estamos ainda no primeiro impacto de um enorme “terramoto”…

Este “mundo novo” para o sector dos Media & Entretenimento abre novas oportunidades, mas obriga a uma grande percepção das alterações sociais e económicas. Algumas destas alterações e impactos foram antecipadas por Chuck Martin (“cyberfuturologista”) no livro Net Future (1998).

Na indústria de Media & Entretenimento os principais “abalos” no sector foram e estão a ser, provocados por três factores:

  • Convergência de Conteúdos
  • Web 2.0 (redes sociais)
  • Factor Geracional – cruzamento das gerações: Baby Boomers, Geração X, Geração Y e Nativos Digitais

– Convergência de Conteúdos

A produção de conteúdos digitais:

Um dos primeiros “visionários” a perceber as alterações da digitalização foi Nicholas Negroponte, fundador do Media Lab do Massachusetts Institut of Technology (MIT),  que explicou no seu livro Ser Digital (1995) as alterações nos negócios pela passagem de átomos para bits.
Nos Media este impacto foi enorme. Pela primeira vez , conteúdos de texto, áudio, imagem e vídeo passam a partilhar as mesmas plataformas, enriquecendo a informação e o entretenimento com conteúdo multimédia.

Distribuição e aumento da concorrência:
A evolução das plataformas, mesmo as tradicionais estão a mudar para plataformas de distribuição com tecnologia digital (como por exemplo: DVB/TDT – Televisão Digital Terrestre e DAB- Digital Audio Broadcast). Por sua vez, os conteúdos passaram a estar disponíveis em múltiplos dispositivos (clique aqui para ver artigo e ilustração “Tracing the Evolution of Consumer Electronics. What’s Next?” da Fast Company Julho de 2009), muitos deles evoluíram e convergiram em funcionalidades.

A concorrência/oferta de conteúdos aumentou substancialmente e as “fronteiras” entre os meios desaparecem, pois a “tradicional” separação de conteúdos “desaparece” nos meios digitais onde a Imprensa, a Rádio  e a Televisão passam a competir no mesmo espaço por audiências e receitas. Para além disso, as plataformas digitais assentes na distribuição IP (internet protocol), têm poucas barreiras à entrada o que levou a um aumento de novos players no mercado.

Fragmentação de audiências:

A possibilidade dos consumidores poderem aceder aos conteúdos em múltiplas plataformas provocou uma fragmentação da audiência por várias plataformas e dispositivos, provocando uma enorme alteração do modelo de consumo e alterando o paradigma para o que Christian Nissen baptizou de “O Lago”,  onde os consumidores escolhem o que querem, no momento que querem, no dispositivo que quirem terminando com a “ditadura da programação” e o consumo linear.

Fonte: Christian S. Nissen– Maio 2007 – Social responsibility for free opinion making through new digital media?

Fontes de receita:
A publicidade “tradicional” foi durante muito tempo a única fonte de receita, no caso das TV e Rádio (em sinal aberto). No caso da Imprensa a venda em banca e a publicidade eram as duas fontes de receitas deste meio.  Hoje, a realidade destes Media é diferente e dispersa-se por várias plataformas criando novos mercados de publicidade digital (display, search, branded content, branded experience, branded engagment, ingame advertising, rich media, etc.).
O negócio tornou-se mais complexo e obriga a alterações profundas nas organizações de Media, principalmente ao nível tecnológico e de recursos humanos, etc.
As plataformas digitais trouxeram também uma grande capacidade de medição das audiências em tempo real, o que é uma alteração também profunda na forma de gerir e criar oferta publicitária.
Para além disso, o meio digital abre também a possibilidade de novos modelos de negócio, como conteúdos pagos (exemplo: canais de TV por cabo, TDT venda de conteúdos on line, etc.), venda de bens físicos e digitais, assim como serviços em plataformas digitais.

Novos custos:
As alterações do modelo de negócio digital obrigaram as organizações a novas estruturas de recursos humanos com novas qualificações e novos perfis. Apesar de em algumas situações os custos de distribuição e de produção digital serem mais baixos, e haver a possibilidade de criação de sinergias na produção de conteúdos entre plataformas digitais e “tradicionais”, há no entanto, algum cuidado a ter com a produção e distribuição de conteúdos digitais. Ao contrário da tradicional distribuição “Broadcast”, que tem características de bem público (não obriga a mais custos para fornecer conteúdo a cada consumidor adicional), a distribuição digital tem vindo a assistir a custos cada vez mais reduzidos, provocados pela inovação tecnológica (Lei de Moore – de 18 em 18 meses a capacidade de processamento duplica). Mas há custos associados a cada consumidor adicional – largura de banda, espaço em disco, processamento nos servidores e sobretudo energia eléctrica.  Ao contrário do que Chris Anderson tenta transmitir no seu livro Grátis ( ouça a entrevista do jornalista Carlos Vaz Marques a Chris Anderson no programa Pessoal e Transmissível – TSF) esta teoria tem na minha opinião algumas falhas graves do ponto de vista económico e confunde conceitos de “movimentos sociais” de colaboração e partilha, com “gratuitidade”.
Por exemplo, o YouTube tem um problema crítico e complexo para gerir que é o facto de apenas  4% do conteúdo alojado gerar tráfego significativo e com potencial de rentabilização. Mas dado o modelo de negócio criado pelo YouTube (e outras redes sociais), tem que alojar e servir todos os vídeos que os utilizadores publicarem.
Ou seja, tem custos exagerados com o alojamento e manutenção de conteúdos que não são procurados, o que destrói também a primeira teoria de Chris Anderson: A Cauda Longa , pois mesmo que existam receitas associadas a estes vídeos (com publicidade), os custos de alojamento e disponibilização ao longo dos anos com estes vídeos nunca conseguirão ser pagos com publicidade.
Mantêm-se pois, a velha máxima económica que: “Não há almoços grátis”.

Cloud Computing (Computação na “Nuvem”/Web):
Do ponto de vista das organizações, há  hoje uma forte tendência para ter os seus data centers fora de “portas” para se forcarem nos negócios e minimizarem custos em tecnologia. As resistências relativas à segurança, confidencialidade e fiabilidade desaparecerão ao longo do tempo e os ganhos de produtividade serão um argumento forte.
Para os indivíduos, o facto de poderem aceder a aplicações – ferramentas de trabalho, comunicação e entretenimento – e documentos de trabalho ou pessoais a partir de qualquer dispositivo (PC, telemóvel, etc.), passará a ser um serviço “vital” e “natural” de trabalho, para ouvir música, ver e partilhar fotos, vídeos, etc.

Ao nível dos dispositivos, o “Cloud Computing” provocará também alterações substanciais, pois passarão a necessitar de menos capacidade de processamento e de armazenamento – que são realizados pela “nuvem” – e passarão a ser dispositivos mais “básicos” e muito mais baratos.

– Web 2.0 (redes sociais)

A Web 2.0 conseguiu demonstrar o seu potencial através das redes sociais, onde é visível o crescimento sustentado de audiência.
As alterações nos dispositivos permitem aceder aos conteúdos, mas também criar, publicar e partilhar de conteúdos, seja através de computadores, netbooks ou telemóveis
Nos próximos anos, surgirão novas Redes Sociais segmentadas por temas e grupos dentro das redes sociais “generalistas”, recuperando o conceito inicial da web 1.0 de “Comunidades Virtuais” em torno de conteúdos, comportamentos, celebridades, etc.

Um bom exemplo, é o caso da rede social criada em torno do candidato, e hoje presidente dos Estados Unidos da América, Barack Obama – my.barackobama.com .

Trata-se de um claro sinal dos tempos e da importância das redes sociais na passagem de informação e associação entre as pessoas em torno de um tema, de uma causa e uma de personalidade.
Alguns dados relevantes sobre o fenómeno das redes sociais: em média um utilizador faz actualizações de 3 em 3 horas no Twitter, 37 minutos no Facebook, 5 vezes ao dia no Flickr, vê diariamente 2,5 horas de vídeos no You Tube e dá 4 opiniões por semana no Yeld.

– Factor Geracional – Cruzamento das gerações: Baby Boomers, Geração X, Geração Y e Nativos Digitais

Estas alterações tiveram grandes impactos na vida de quatro gerações, seja na forma de trabalhar, comunicar e relacionar.
Os baby boomers que tiveram maiores dificuldades na adaptação às novas tecnologias, são hoje fortes “aliados” da Geração Y (filhos ou netos) e encaram a vida e o mundo de forma muito próxima.
A Internet aproximou todas as gerações pela potencialidade de comunicação e pela partilha de opinião em tempo real (nas redes sociais).

Nos Estados Unidos, o país onde a cultura digital está mais desenvolvida, a geração dos Baby Boomers que ainda estão na vida activa profissional em funções importantes em grandes organizações, têm contratado jovens recém-licenciados para seus “assessores” para os ajudarem a “pensar o negócio digital”.
A adaptação das gerações mais velhas às novas tecnologias e no acesso à internet tem aumentado pela massificação da banda larga e pela simplicidade das aplicações e sites.
O número de utilizadores continuará a crescer e será impulsionada por três factores: a massificação do acesso em banda larga, o crescimento da geração de “nativos digitais” e a cada vez melhor usabilidade das aplicações de sites que vão sustentar o crescimento da população com acesso à Rede em múltiplas plataformas (web, Mobile, Consolas, Netbooks, TabletPC´s, etc.) e o aumento do tempo médio despendido no consumo de conteúdos e serviços Online.

Nuno Ribeiro

Nota: Artigo publicado no jornal Meios & Publicidade de 15/01/2010

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